Céticos apresentam diversos argumentos contra a Bíblia, mas um deles se destaca como o mais fraco, pois, se levado a sério, comprometeria toda a compreensão da história. Trata-se do argumento das cópias de cópias. De acordo com essa ideia, a falta dos manuscritos originais dos textos bíblicos impediria a certeza sobre o conteúdo original, sugerindo que ele pode ter sido significativamente alterado ao longo do processo de cópia. Esse argumento é frequentemente utilizado por ateus e, ocasionalmente, por muçulmanos que repetem raciocínios ateístas. Mesmo estudiosos que deveriam ter um entendimento mais sólido sobre o tema acabam promovendo esse tipo de ceticismo em relação às Escrituras, como evidenciado em entrevistas com acadêmicos do Novo Testamento em canais que favorecem a visão islâmica.
O Evangelho de Mateus original não está disponível, apenas cópias feitas a partir do texto original. Além disso, não há acesso às primeiras cópias nem às cópias subsequentes dessas versões iniciais. As cópias que chegaram até o presente são de períodos posteriores, e a primeira versão completa do Evangelho de Mateus, preservada em um manuscrito integral, data de aproximadamente 300 anos após sua redação original.
Irman está correto ao afirmar que os manuscritos originais da Bíblia não estão mais disponíveis, mas esse argumento é falho por um motivo importante: nenhum manuscrito original de obras da antiguidade foi preservado. Textos como A República de Platão, as histórias judaicas de Flávio Josefo, os registros históricos romanos de Tácito ou os relatos gregos de Tucídides também não possuem versões originais. Essas obras foram escritas em materiais perecíveis, como folhas secas ou peles de animais, que se perderam, foram destruídas ou deterioraram com o tempo.
No entanto, os estudiosos modernos conseguem reconstruir os textos originais dessas obras com um alto grau de precisão ao comparar as cópias sobreviventes por meio de um método chamado crítica textual. Por exemplo, embora nenhum manuscrito original de Platão tenha sido preservado, existem cerca de 250 manuscritos antigos que auxiliam na reconstrução de seus escritos. Para muitos outros autores antigos, há apenas um número reduzido de cópias disponíveis, e, em alguns casos, apenas uma única cópia de um manuscrito escrito séculos ou até milênios depois da versão original.
Apesar dessa limitação, os estudiosos conseguem determinar com precisão o conteúdo original desses textos. Aplicando essa mesma lógica, a confiabilidade do Novo Testamento pode ser analisada com base nas evidências manuscritas da seguinte maneira:
- As cópias de obras antigas não bíblicas são consideradas precisas e refletem fielmente o que os autores originalmente escreveram.
- A Bíblia possui um volume de evidências manuscritas superior ao de muitas dessas obras não bíblicas.
- Portanto, é razoável afirmar que as cópias da Bíblia refletem com igual ou maior precisão o que seus autores originalmente escreveram.
A maior parte dos críticos aceita o primeiro ponto, mas quando essa lógica é aplicada à Bíblia, há uma resistência em admitir a conclusão. Alguns céticos optam por uma abordagem ainda mais radical, alegando que não é possível saber com certeza o que qualquer autor antigo escreveu. No entanto, essa postura extrema comprometeria a compreensão de grande parte da história, tornando inviável qualquer análise confiável sobre o passado.
Outros críticos tentam argumentar que a Bíblia deveria ser submetida a um padrão mais rigoroso de verificação devido à importância de seus ensinamentos sobre salvação, inferno e moralidade, em comparação com obras como as de Platão ou Josefo. Contudo, esse critério diferenciado não se sustenta. Para ilustrar essa questão, basta considerar o impacto das informações médicas disponíveis atualmente.
Confia-se nos medicamentos com base nas informações fornecidas nos rótulos. Se houver uma leve coceira, acredita-se que um creme antialérgico é realmente o que está indicado na embalagem. No entanto, em um caso de reação alérgica grave que exige um medicamento específico para salvar a vida, não se exige um nível extra de evidência apenas porque esse medicamento tem um impacto mais significativo do que um creme para coceira. O rótulo é suficiente para garantir sua autenticidade, assim como ocorre com outros medicamentos. Pode-se verificar a embalagem mais de uma vez para evitar erros, mas não é necessário entrar em contato com a fábrica para confirmar que o medicamento está rotulado corretamente. Da mesma forma, o impacto potencial da Bíblia na vida das pessoas não justifica a exigência de um padrão de evidência mais rigoroso para ela do que para qualquer outra obra antiga.
Outro argumento cético comumente utilizado nesse contexto é conhecido como argumento do Homem-Aranha. Ele sugere que existem milhões de relatos sobre esse personagem salvando pessoas em Nova York, mas isso não significa que esses eventos realmente aconteceram. O canal cristão Testify publicou um vídeo refutando esse argumento, demonstrando que ele não se sustenta logicamente. A questão principal não é provar a veracidade da Bíblia apenas com base no número de manuscritos disponíveis, mas sim responder à alegação de que as cópias atuais não refletem com precisão o que os autores originais escreveram. A refutação se concentra na fidelidade dos manuscritos e não na veracidade do conteúdo em si, que pode ser discutida separadamente. Antes de avaliar a veracidade do que foi escrito, é necessário primeiro estabelecer o que realmente foi registrado pelos autores originais.
O que torna o Novo Testamento único em comparação com outras obras antigas não é apenas a quantidade excepcional de cópias disponíveis, mas também o alto grau de zelo com que essas cópias foram preservadas. Atualmente, existem mais de 5.500 manuscritos do Novo Testamento em grego, além de 15.000 cópias em outras línguas, como latim, copta e siríaco. Entre os manuscritos gregos, pelo menos 50 podem ser datados em um intervalo de até 250 anos após os originais. A primeira cópia completa do Novo Testamento, conhecida como Códice Sinaítico — descoberta em um mosteiro no sopé do Monte Sinai —, pode ser datada de aproximadamente 300 anos após a redação original dos textos.
Pode-se questionar o motivo dessa quantidade de manuscritos ser considerada impressionante, uma vez que existem 50 manuscritos do Novo Testamento nos primeiros dois séculos, enquanto há 250 cópias dos Diálogos de Platão. No entanto, há um fator distintivo que torna o Novo Testamento um caso especial.
Os Diálogos de Platão possuem cerca de 250 manuscritos preservados, mas apenas dois fragmentos desses manuscritos são provenientes dos primeiros 400 anos após sua redação. A cópia completa mais antiga dessa obra só surgiu 1.200 anos depois do original. Em contraste, o Novo Testamento possui uma cópia completa já 300 anos após sua composição.
Um exemplo semelhante é a Ilíada, de Homero, escrita no século VIII a.C. Embora alguns fragmentos possam ser datados de até 500 anos após a época de Homero, a cópia completa mais antiga disponível, conhecida como Venetus A, foi escrita no século X d.C., ou seja, aproximadamente 1.800 anos depois. O estudioso da Bíblia F. F. Bruce resumiu essa questão afirmando que não há nenhum outro corpo de literatura antiga no mundo que possua um nível tão elevado de atestação textual quanto o Novo Testamento.
A grande quantidade de cópias do Novo Testamento se deve ao fato de que, conforme as comunidades cristãs surgiam na Europa e na Ásia, havia uma demanda por cópias das Escrituras, tanto para uso litúrgico quanto para leitura particular. Durante esse período, o cristianismo era ilegal no Império Romano, e os escribas cristãos enfrentavam longas horas de escrita manual e até mesmo o risco de perseguição e morte para garantir que outras pessoas tivessem acesso ao texto sagrado. Embora algumas dessas cópias tenham sido perdidas, muitas foram preservadas devido à crença de que a transcrição dos textos era um ato de glorificação a Deus. Os manuscritos produzidos eram considerados objetos de devoção e, por isso, foram protegidos ao longo dos séculos. No século VI, o monge Cassiodoro, contemporâneo de São Bento, expressou essa ideia ao afirmar que transcrever as Escrituras era uma forma de evangelizar por meio da escrita, trazendo salvação silenciosa e combatendo as armadilhas do mal com tinta e pergaminho.
Outro argumento levantado por céticos tem origem no livro Misquoting Jesus, de Bart Ehrman, onde se afirma que há mais diferenças entre os manuscritos do Novo Testamento do que palavras no próprio texto. Estima-se que existam entre 200.000 e 400.000 variações entre os manuscritos do Novo Testamento, sendo que nenhum manuscrito bíblico é idêntico a outro. No entanto, esse alto número de variantes deve ser visto como um fator positivo, e não como um obstáculo à reconstrução do texto original.
A razão para a existência de tantas variações é justamente a grande quantidade de manuscritos disponíveis. Se cada um dos cerca de 20.000 manuscritos do Novo Testamento conhecidos contiver, em média, 20 variantes, o total chegaria a 400.000 variações. No entanto, quando esse número é distribuído entre os diversos manuscritos, observa-se que cada um apresenta, na maioria dos casos, apenas algumas dezenas de variações menores.
Para efeito de comparação, os primeiros seis livros dos Anais de Tácito, uma das principais fontes sobre a Roma Antiga, possuem apenas uma única cópia preservada, escrita aproximadamente mil anos após o original. Essa cópia não apresenta variações, mas isso ocorre porque não existem outras versões para comparação. Esse fato reduz a confiança na reconstrução do texto original, mesmo que os estudiosos ainda considerem sua autenticidade histórica válida, apesar da escassez de evidências manuscritas.
Um Novo Testamento com muitas variações distribuídas entre um grande número de manuscritos é mais confiável do que um com poucas variações presentes em um número reduzido de cópias. Isso ocorre porque a grande maioria das diferenças entre os manuscritos é insignificante e pode ser facilmente corrigida. Por exemplo, um nome ou palavra pode ter sido grafado de forma incorreta, mas pode ser ajustado por qualquer pessoa que conheça a grafia correta. Em outros casos, o contexto da passagem torna evidente qual é a leitura correta, como em 1 Tessalonicenses 2:7, onde Paulo diz: “Fomos gentis entre vós, como uma ama que cuida dos seus filhos.” Algumas variantes usam uma palavra grega semelhante, tornando a frase “Fomos como crianças entre vós”, sem alterar o significado. No entanto, um manuscrito contém um erro isolado que transforma a passagem em “Fomos cavalos entre vós”, um erro de escrita facilmente descartado quando comparado a todas as outras cópias.
A maioria das variações nos manuscritos do Novo Testamento envolve questões menores como essas. O estudioso Craig Blomberg observa que apenas 0,1% das variações são significativas o suficiente para serem mencionadas em notas de rodapé das traduções em inglês. Além disso, nenhuma doutrina cristã essencial ou prática ética depende exclusivamente de uma única passagem disputada, pois há sempre trechos inquestionáveis que reforçam os mesmos ensinamentos. Curiosamente, na edição de bolso de seu livro Misquoting Jesus, Bart Ehrman admite no apêndice que as crenças cristãs fundamentais não são afetadas pelas variações textuais nos manuscritos do Novo Testamento. Essa admissão, no entanto, só aparece após críticas frequentes e está relegada a uma seção secundária do livro.
Alguns críticos argumentam que a maioria dos manuscritos disponíveis data de séculos posteriores ao período de composição original, o que impediria uma reconstrução precisa do Novo Testamento nos primeiros séculos da transmissão textual. É importante, no entanto, que a evidência manuscrita não seja exagerada. Não há 25.000 ou mesmo 5.000 manuscritos antigos dos primeiros séculos da história da Igreja. A maior parte dos manuscritos remanescentes vem da Idade Média. O número correto para os dois primeiros séculos do cristianismo é de algumas dezenas de manuscritos, muitos dos quais são fragmentos e não cópias completas. No entanto, isso ainda representa uma condição muito superior à de outros textos antigos, que passaram séculos sem qualquer cópia parcial ou completa sendo preservada.
Além disso, a comparação entre manuscritos antigos reforça a confiabilidade da transmissão do texto. O papiro P75, que contém grandes porções dos evangelhos de Lucas e João e é datado do final do século II, pode ser comparado ao Códice Vaticano, um manuscrito do início do século IV que contém toda a Bíblia. Apesar da diferença de 100 a 150 anos entre esses documentos, ambos apresentam, conforme o estudioso Daniel Wallace, um grau incrivelmente alto de concordância textual. Essa similaridade é ainda mais notável considerando que o Códice Vaticano não foi copiado a partir do P75, mas ambos derivam de um manuscrito anterior comum.
O estudioso do Novo Testamento Craig Evans sugere que os documentos originais do Novo Testamento podem ter circulado por um período muito mais longo do que se imaginava. Ele argumenta que os autógrafos e as primeiras cópias podem ter sido preservados até o final do século II ou até o início do século III. A longevidade desses manuscritos serviu como uma ponte entre os documentos originais do século I e as grandes compilações codificadas posteriormente, permitindo que as primeiras cópias fossem preservadas por um período prolongado. Isso demonstra que os primeiros séculos do cristianismo não foram um “buraco negro” textual, pois os documentos originais tiveram uma longa vida útil e foram preservados por diversas linhas de transmissão independentes ao longo do processo de cópia.
Além das evidências manuscritas, há também o testemunho dos Pais da Igreja, que preservaram a Bíblia ao ensiná-la e comentá-la ao longo dos séculos. Embora os manuscritos que eles consultaram não tenham sido preservados, o conteúdo desses textos sobreviveu por meio das citações feitas em seus comentários e escritos sobre as Escrituras. Bart Ehrman reconheceu que esse material é uma fonte valiosa para a crítica textual, afirmando, juntamente com Bruce Metzger, que as citações dos Pais da Igreja são tão extensas que, mesmo que todas as outras fontes do Novo Testamento fossem destruídas, seria possível reconstruí-lo quase integralmente apenas com base nesses escritos. Essa observação foi feita em um livro acadêmico coautorado por Ehrman e Metzger, e não está claro se Ehrman ainda mantém essa posição.
Uma questão notável sobre Ehrman é que, em suas obras destinadas ao público geral, como Misquoting Jesus, ele tende a apresentar declarações amplas que geram dúvidas sobre a confiabilidade da Bíblia, sugerindo que seu texto teria sido “perdido” ao longo da história. No entanto, em seus trabalhos acadêmicos, suas análises são mais equilibradas e menos sensacionalistas. O filósofo William Lane Craig destacou essa diferença, classificando Ehrman em duas categorias: o “bom Ehrman”, o estudioso que reconhece a precisão do texto do Novo Testamento, e o “mau Ehrman”, que enfatiza incertezas de maneira exagerada ao se dirigir a audiências leigas e céticas.
Em entrevistas, essa diferença se torna ainda mais evidente. Em um programa de rádio sobre Misquoting Jesus, um entrevistador perguntou a Ehrman sobre a suposta incerteza do texto do Novo Testamento, mencionando as milhares de variações encontradas nos manuscritos. No entanto, quando pressionado sobre o que ele acreditava que o texto original realmente dizia, Ehrman respondeu com surpresa: “Não entendo o que você quer dizer.” O entrevistador insistiu, mencionando que o Novo Testamento teria sido corrompido ao longo do tempo, e Ehrman então admitiu: “Bem, ele diz praticamente o que temos hoje.” Essa resposta causou confusão no entrevistador, que esperava uma conclusão mais cética. Ehrman explicou que os estudiosos conseguiram reconstituir o texto do Novo Testamento com um grau de certeza de aproximadamente 99%, deixando claro que, apesar das variações nos manuscritos, o conteúdo essencial foi preservado com precisão.
O fato de terem sido descobertos apenas 50 manuscritos dos primeiros séculos sugere que, naquela época, havia centenas ou até milhares de cópias em circulação, que, assim como a maioria dos manuscritos do mundo antigo, acabaram se perdendo ao longo do tempo. Além disso, é importante lembrar que esses textos também foram preservados na memória das pessoas que os ouviam nas liturgias, tornando-se, de certa forma, “manuscritos vivos”. Esse fato refuta a ideia de que a Bíblia teria sido ocultada dos fiéis ao longo da história.
Um exemplo dessa forte tradição oral pode ser encontrado nos escritos de Santo Agostinho, que relatou a reação dos fiéis quando uma nova tradução das Escrituras foi introduzida. Ele descreve que um bispo, ao ler uma versão revisada do Livro de Jonas, encontrou uma tradução que diferia daquela que havia sido amplamente conhecida e recitada por gerações na Igreja. Isso causou uma forte reação entre os fiéis, especialmente entre os cristãos de língua grega, que corrigiram publicamente a leitura e rejeitaram a nova tradução como incorreta. A comoção foi tão grande que o bispo precisou recorrer aos judeus da cidade para confirmar a tradução adequada. Esse episódio evidencia como os textos bíblicos eram amplamente conhecidos e memorizados pelos cristãos comuns, o que contribuiu para a preservação da mensagem original ao longo dos séculos.
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Por fim, diversos estudos sobre a confiabilidade textual da Bíblia foram realizados por estudiosos protestantes, muitos dos quais têm oferecido contribuições valiosas para a crítica textual e a defesa da integridade das Escrituras. Um exemplo é o trabalho de Wes Huff, cuja pesquisa doutoral é focada na crítica textual e na apologética cristã. No entanto, algumas de suas interpretações sobre a formação do cânon bíblico e os livros deuterocanônicos apresentam equívocos, conforme discutido em análises mais detalhadas sobre o tema.
Por essa razão, é essencial que estudiosos e fiéis aprofundem seus conhecimentos sobre a historicidade e a preservação textual da Bíblia, garantindo assim uma defesa bem fundamentada das Escrituras. Há diversas obras disponíveis sobre esse assunto que exploram a confiabilidade do texto bíblico com base em evidências históricas e acadêmicas.
Referência: Catholic Answers

Sou Bruna Souza, redatora apaixonada pela Palavra de Deus. Escrevo para inspirar e fortalecer a fé, trazendo reflexões claras e acessíveis sobre a Bíblia. Meu objetivo é ajudar leitores a compreenderem as Escrituras e aplicarem seus ensinamentos no dia a dia, promovendo crescimento espiritual e conexão com Deus.