A ironia era evidente.
Durante uma campanha de evangelismo com o grupo Jews for Jesus, em meio ao calor intenso do verão de Nova York, um homem se aproximou no metrô e fez uma afirmação recorrente, mais para evitar o evangelho do que para compreendê-lo:
“O motivo pelo qual você é judeu e acredita em Jesus é porque é jovem e influenciável.”
Ao ouvir isso, foi feita uma simples pergunta sobre sua idade. “Trinta e oito”, respondeu ele.
Diante da resposta, a réplica foi direta: “Bem, tenho quarenta e dois.”
Era preocupante perceber o quanto o coração de seu irmão estava endurecido. Assim como ele, durante muito tempo, também havia sido estabelecida uma divisão clara entre a fé judaica e a cristã. A infância e a juventude foram marcadas pela valorização da herança judaica, sem uma compreensão profunda sobre o Deus que criou todas as coisas. A ideia de um Deus ativo no mundo, que deseja um relacionamento próximo com as pessoas, parecia distante – um sentimento compartilhado por muitos.
A natureza humana tende a criar divisões e estabelecer limites, até mesmo ao interpretar a Bíblia, separando o que é considerado relevante do que não é. Há quem afirme que o Antigo Testamento se aplica apenas aos judeus ou que os cristãos devem se concentrar exclusivamente no Novo Testamento. Mas e se as conexões entre ambos fossem mais bem compreendidas? E se houvesse uma Bíblia que ajudasse os leitores a explorar o contexto judaico em que as Escrituras foram escritas e a compreender melhor aqueles que primeiro tiveram acesso a elas?
Com essas questões em mente e o desejo de proporcionar uma nova perspectiva sobre a Bíblia, foi iniciado o trabalho de atualização do livro intitulado Chronological Life Application Study Bible. Aproveitando a base já existente, a equipe se dedicou a acrescentar notas de estudo focadas na cultura e no contexto judaico da antiguidade, além de desenvolver novos recursos que destacam personagens importantes das Escrituras. Também foram elaborados artigos explicando tradições antigas, como o calendário judaico. O objetivo era revelar a Bíblia como uma narrativa unificada, enraizada na tradição judaica, mas relevante tanto para judeus quanto para não judeus.
Isso é fundamental porque permite compreender a Bíblia em seu contexto original. O entendimento das Escrituras dentro de sua cultura e tradição ajuda a esclarecer muitas passagens e eventos. A conversa com aquele conhecido judeu em Nova York poderia ter sido completamente diferente se ele tivesse compreendido a importância de Jesus celebrar as festividades judaicas.
Por exemplo, ao ler João 7 com a compreensão de que os eventos ocorrem durante a festividade judaica de Sukkot—também conhecida como a Festa dos Tabernáculos ou das Cabanas—muitos detalhes ganham um novo significado. Quando Jesus falou “no último dia, o mais importante da festa” (João 7:37), uma cerimônia de libação da água estava acontecendo no Templo. Suas palavras sobre “água viva” fluindo do interior daqueles que têm sede espiritual teriam sido imediatamente associadas ao ritual que ocorria ao redor.
Da mesma forma, em João 8:12, Jesus declarou ser “a luz do mundo” no momento em que grandes candelabros estavam acesos durante a celebração. Essas luzes, visíveis de diferentes pontos de Jerusalém, iluminavam o Monte do Templo, tornando sua declaração ainda mais impactante para quem estava presente.
Essas passagens mostram como Jesus ensinava conectando suas mensagens ao que as pessoas estavam vivenciando e refletindo naquele momento. Ele partia de elementos familiares ao público para conduzi-los a verdades espirituais mais profundas. Seguir esse exemplo em conversas cotidianas pode ser uma forma eficaz de compartilhar sua mensagem, trazendo a verdade bíblica para o contexto e a realidade de cada pessoa.
Percebe-se como João 7 ganha um novo significado quando há uma compreensão mais profunda sobre Sukkot. Para os judeus que ainda celebram essas festividades nos dias de hoje, a conexão entre os ensinamentos de Jesus e uma celebração que sempre fizeram parte de suas vidas poderia ser algo revelador e emocionante.
Compreender a história e a cultura antiga da Bíblia é essencial, mas o envolvimento com as Escrituras vai além do aprendizado sobre tradições judaicas. É necessário trazer a verdade bíblica para o contexto atual e refletir sobre como Deus pode usar esse conhecimento para levar esperança àqueles que vivem em meio ao medo e ao desespero.
No contexto da comunidade judaica, o aumento do antissemitismo na América do Norte e na Europa tem sido alarmante. Muitos judeus relatam sentir-se ameaçados e inseguros em suas cidades e universidades. Alguns acreditam que o evangelho e o Novo Testamento estão na raiz desse problema.
Para muitos cristãos, essa ideia pode parecer absurda. No entanto, para aqueles com uma herança marcada por eventos traumáticos, como as Cruzadas, os deslocamentos forçados e o Holocausto, sentimentos de dor e medo em relação ao cristianismo podem parecer uma resposta compreensível.
Como responder à alegação de que o Novo Testamento é antissemita?
No livro Chronological Life Application Study Bible, são analisadas seis passagens frequentemente usadas para sustentar essa ideia e explora maneiras de refutá-las.
Interpretar essas passagens no contexto atual pode ser um desafio. Infelizmente, ao longo da história, alguns cristãos demonstraram atitudes antissemitas e, em alguns casos, isso ainda ocorre. Esse fenômeno, conhecido como “antissemitismo cristão”, muitas vezes surge quando instituições religiosas são usadas para promover interesses próprios. É fundamental lamentar as atrocidades cometidas em nome de Jesus, mas isso não deve abalar a confiança nas palavras do Novo Testamento.
O compromisso deve ser compreender a dor da comunidade judaica, combater o ódio e ser uma voz ativa pela mudança. Algumas ações práticas podem contribuir para isso:
- Aprender sobre o povo judeu
Aprofundar o conhecimento sobre a história e a cultura judaica pode trazer uma nova perspectiva. Ler livros como O Diário de Anne Frank, assistir a filmes como Exodus ou visitar um museu judaico são formas valiosas de aprendizado. Além disso, estabelecer laços pessoais, convidando amigos judeus para uma refeição e ouvindo suas experiências, pode fortalecer o entendimento mútuo. - Identificar o antissemitismo
O antissemitismo pode se manifestar de diversas maneiras. Alguns sinais que indicam sua presença incluem:- Alegações de que os judeus controlam sistemas financeiros, a mídia ou a política.
- Representações estereotipadas ou caricaturais de pessoas judias.
- Atribuição de problemas sociais ao povo judeu.
- Manifestar-se contra o preconceito
A história ensina a importância de não permanecer em silêncio diante da injustiça. Um exemplo marcante é a reflexão do pastor alemão Martin Niemöller durante a Segunda Guerra Mundial: “Primeiro vieram buscar os comunistas, e eu não protestei, porque não era comunista. Depois vieram buscar os sindicalistas, e eu não protestei, porque não era sindicalista. Depois vieram buscar os judeus, e eu não protestei, porque não era judeu. Então vieram me buscar—e já não havia ninguém para falar por mim.” Ficar em silêncio diante da intolerância permite que ela se espalhe. Posicionar-se contra o ódio é uma responsabilidade compartilhada.
Conclusão
Compreender o contexto judaico da vida de Jesus e dos escritos do Novo Testamento traz benefícios para todos. Ao reconhecer que o Novo Testamento não é antissemita, mas, ao contrário, reafirma as raízes judaicas da mensagem do evangelho, barreiras são derrubadas, permitindo uma compreensão mais profunda tanto de Deus quanto da humanidade criada à sua imagem. O conhecimento sobre a herança judaica do evangelho pode transformar a visão tanto de judeus quanto de não judeus.
À medida que mais cristãos passam a conhecer melhor o contexto judaico de Jesus e do Novo Testamento, tornam-se mais preparados para compartilhar a mensagem do evangelho com amigos judeus e também enriquecem sua própria experiência de adoração. Mesmo aqueles que já possuem uma base sólida nesse conhecimento podem continuar descobrindo novos aspectos da Bíblia que aprofundam sua compreensão.
O Reino de Cristo une judeus e não judeus, mostrando que ambos são parte essencial da plenitude da mensagem do evangelho. Em vez de permitir que essas diferenças criem separação, há sempre a oportunidade de aprender e crescer juntos.
Referência: Annvoskamp

Sou Bruna Souza, redatora apaixonada pela Palavra de Deus. Escrevo para inspirar e fortalecer a fé, trazendo reflexões claras e acessíveis sobre a Bíblia. Meu objetivo é ajudar leitores a compreenderem as Escrituras e aplicarem seus ensinamentos no dia a dia, promovendo crescimento espiritual e conexão com Deus.